A paralisação das obras de construção do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu, em Maragogipe, provocou a demissão de mais 3 mil
trabalhadores, reduziu a arrecadação de vários municípios do Recôncavo
e ameaça a retomada da indústria naval da Bahia. Mas tudo isso é apenas
uma parte do problema. A outra - não menos dramática - é formada por
dezenas de pequenos empreendedores.
Gente
simples e batalhadora, que juntou a economia de uma vida inteira para
abrir um novo negócio ou então tomou empréstimos em bancos para ampliar
restaurantes, pousadas e supermercados e atender à nova demanda.
Com
a crise de liquidez no estaleiro e a desaceleração do projeto, muitos
empresários não resistiram e fecharam as portas. Muitos outros estão,
literalmente, com a corda no pescoço, à beira da falência. "Foi um
baque muito forte", lamenta Jailson Bonfim Lima, 38 anos, dono do
mercado Cinco Estrelas.
A mercearia
de Jailson fica em Enseada do Paraguaçu, o distrito mais próximo do
estaleiro. No pequeno vilarejo, de casas simples, ruas estreitas e
esburacadas e quase nenhum serviço público, residem cerca de 800
pessoas. Detalhe: quase todas elas trabalharam no estaleiro. Era a
oportunidade que Jailson precisava para crescer e expandir os seus
negócios. Tinha um pequeno bar e o transformou num mercado amplo e
sortido. Em dia de pagamento de salários no estaleiro, o local ficava
cheio "Fazia fila. Muitos nem pagavam a conta na hora. Eu anotava no
caderninho e só recebia 30, 60 dias depois, não me importava", conta.
Com
a falta de liquidez no consórcio construtor do estaleiro, a partir do
final do ano passado, começaram as demissões em massa. Resultado: o
movimento no Cinco Estrelas minguou. Os produtos encalharam nas
prateleiras. Há poucos dias, Jailson jogou fora R$ 8,5 mil em
mercadorias vencidas. Já não consegue pagar em dia a conta de telefone e
o aluguel das máquinas de cartão de crédito e débito. Está com o nome
negativado.
"O movimento aqui caiu 99%", calcula Jailson, que estava construindo uma pequena pousada
ao lado do mercado. Suspendeu a obra por falta de recursos e de
qualquer perspectiva de hóspedes por lá. "Minha irmã tinha uma
lanchonete aqui e fechou. É tudo muito triste", observa.
Depressão econômica
O
distrito de Enseada vive hoje o que se pode chamar de depressão
econômica - uma combinação perversa de desemprego, falência de pequenos
negócios e quase nenhum dinheiro circulando pela localidade. Perto
dali, na agradável São Roque do Paraguaçu, o drama é bem parecido. Que
o diga o empresário Manoel dos Santos, conhecido na região como Bira,
proprietário de uma padaria e da pousada Ponto 10 - com 27 apartamentos
e considerada uma das melhores da localidade.
No
pico das obras de construção do estaleiro, que mobilizou mais de 7,2
mil trabalhadores, a pousada chegou a fornecer duas mil refeições por
dia. A ocupação chegava a 100%. Na última quarta-feira, apenas um
quarto estava ocupado. Pior: o empreendimento está sendo ampliado. Vai ganhar mais 74 apartamentos.
"Já
compramos as tevês e os equipamentos de ar-condicionados para os
novos quartos, mas tivemos que parar o projeto de ampliação. Também
demitimos metade dos nossos funcionários. Tudo isso aqui depende do
estaleiro", afirma José Rodrigo Nascimento Costa, gerente da Ponto 10.
Bem
próximo da pousada funcionava o restaurante Novo Sabor, fechado há um
mês. "Não deu para continuar. Com a parada do estaleiro, passamos a
trabalhar no vermelho. Achamos melhor encerrar as atividades", conta
Oslinda da Silva Cavalcante, que abriu o empreendimento junto com duas
irmãs.
O restaurante funcionava das 8 às 23
horas, empregava quatro pessoas e era frequentado basicamente pelos
funcionários do estaleiro. "Não temos muitas oportunidades aqui.
Acreditava que este projeto ficaria para os meus netos e não aconteceu
nem mesmo para os meus filhos. Mas não perco a esperança de que tudo
seja resolvido em breve".
Fim do consórcio
Afetado
pela crise envolvendo a Petrobras e com falta de liquidez, o consórcio
construtor do estaleiro Enseada do Paraguaçu - formado pelas empresas
OAS, UTC Engenharia e Odebrecht - encerrou suas atividades neste
sábado, 28, por tempo indeterminado.
No ano
passado, a Enseada Indústria Naval (EIN) iniciou a construção de seis
navios-sonda para exploração do pré-sal por encomenda da empresa Sete
Brasil. Contudo, a Sete, que tem entre seus acionistas a Petrobras,
ficou ao menos três meses sem fazer os repasses para a construção dos
equipamentos. A Enseada tem a receber ainda cerca de R$ 600 milhões do
Fundo da Marinha Mercante.
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